25 de dez. de 2007

Anos, tempo e ciclos

Vem chegando o final de mais um ano. E o festejo costumeiro. Todos saem às ruas a caça de presentes. O clima leve de euforia se mistura com a guerra pelos melhores objetos, pelas melhores “promoções”. É natal! E um novo ano se aproxima.

Você deve estar pensando: “ih... esse cara chato vai puxar agora para aquele papo do verdadeiro sentido do natal, falar do nascimento de Jesus e tal”.

Errou!

Mas se pensou isso é talvez porque não me conheça. Não sou exatamente religioso nem nada. “E sobre o que você vai escrever então, meu rapaz?” Não sei... estou pensando ainda!

As festas de ano novo me trazem uma sensação engraçada. A passagem dos anos, aliás! Uma coisa de certa maneira cíclica, que chega quase num “eterno retorno” inventado. Uma regularidade que criamos para as nossas próprias vidas. Mas um retorno ligeiramente alterado. São 14, se não me engano, as possibilidades de calendário*. Isso significa que apesar de todos os anos serem iguais em sua estrutura, muda a combinação de dia-do-mês com o dia-da-semana, de maneira que só vivemos cerca de 6 vezes em cada calendário ao longo da vida**. Isso nos dá a possibilidade de fazer aquela pesquisa: o que de importante na história aconteceu nesse dia-mês, quase que eternizando o que é, por definição, efêmero. Congelar o efêmero! Congelar o tempo! É isso que fazemos o tempo todo. Somos fotógrafos de momentos, de sentimentos. O envelhecer nos torna saudosos. E o sonho? Ah, o sonho é a saudade do futuro, do que ainda não chegou.

Os que vivem o momento, os que sonham e os saudosos são todos humanos. São diferentes reações a um mesmo sentimento. A noção de tempo é talvez o sentimento que define nossa humanidade – e nos separa dos Homo sapiens não-humanos que abundam por aí. Tá, é uma distinção fraca e cheia de problemas que acabei de pensar. Talvez ela não se dirija exatamente ao alvo, mas ao menos traz a tona um elemento interessante. Deixa quieto!

Há um ciclo e uma tendência. Mas o rumo da tendência não é independente do ciclo. O momento de crise espiritual (no bom sentido, de revisão de conceitos e "paradigmas") em que estamos (o fim de cada ano) nos permite ajustar a direção da tendência, do rumo da vida que queremos trilhar.

“Ok. Muito interessante! Mas... aonde você quer chegar?”

A lugar algum, meus caros. E esse é exatamente o grande mistério do tempo!

*Posso ter errado na conta, mas pensei assim: o ano pode começar com qualquer dia da semana (são sete) e pode ser bissexto ou não (duas possibilidades). Então, 7x2 = 14.

**O que dá uma expectativa de vida de 84 anos.

18 de dez. de 2007

Nunca mais

Nunca mais (Quoth the raven: Never more)


Nunca mais eu me pinto,
Com esmero feminino
Para te dizer quem sou.

Nunca mais te escrevo,
Cartas do meu íntimo
Te jurando pudor.

Nunca mais te perdôo,
Com lágrimas nos olhos
E no rosto, um rubor.

Nunca mais eu te verso
Nem por outros versos
Para acalentar minha dor...

Nem mais desespero
Só porque eu te quero
Ébrio de amor...

10 de dez. de 2007

são caras que só lembram que você pode ser linda na hora que eles querem sexo.

são bocas carentes que buscam companhia entre toques e taças.

são garotas vazias que desfilam buscando a evidência de suas coxas e a invisibilidade de suas dores existenciais

são situações que cavo no chão um buraco, onde jogo o pensamento, enterro e me calo.

vida vivida,é você que eu não quero
é você que eu nego

premeditada
destino linha
fatalidade
certezas
dogmas



vida que vivo,vida que vive,vem comigo
dança comigo
atravessa esta rua comigo,porque hoje tudo que quero é deitar
ser vã, vadia e vazia
ser como todos que critico
ser a cara do meu maior inimigo
ser eu mesma com a pior das intenções
ser eu mesma sem um pingo de amor pulsando em meu sangue
ser uma árvore seca pela ausência de alma e luz.

1 de dez. de 2007

Perguntas

Três amigos foram num bar. Beberam, se divertiram. Conversaram sobre tudo o que se conversa num bar, ou seja, de futebol à efemeridade da vida, passando por mulheres, relacionamentos, os meandros da politicagem brasileira e a síntese kantiana. Já eram quase três horas da manhã quando resolveram ir para casa. Pediram a conta.

O simpático garçom a trouxe: 15 reais. Uma pechincha! O dono do bar era amigo pessoal deles - abrira várias cervejas de graça, tomando apenas um copo. Pois bem, cada um sacou uma nota de cinco da carteira e entregou. Quando o dono do bar foi receber, viu que eram seus amigos pagando e, mais para lá do que para cá, pegou 10 reais para o caixa e mandou o garçom devolver-lhes a outra nota de cinco.

O Garçom, muito sabiamente, percebeu que não seria fácil devolver 5 reais para 3 pessoas bêbadas: haveria algum tipo de discussão inconveniente. Teve então a genial idéia. Sacou do bolso direito da sua camisa 5 notas de um real e guardou aquela nota de 5 no referido bolso. Pegou duas das mais velhas daquelas cinco notas e guardou no bolso esquerdo de sua calça social. Entregou uma nota de um real para cada um dos 3 amigos.

Agora. Pense bem! A conta acabou saindo por 4 reais (5 – 1) para cada um. 3x4 = 12. 12 + 2 (que ficou no bolso da calça do garçom) = 14. Engraçado... onde foi parar o outro real?

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Toda pergunta contém em si a sua resposta. A boa prática científica funciona assim: se eu quero pesquisar um tema, devo ter algum juízo prévio sobre o assunto que servirá de guia. É claro que se deve ter flexibilidade para rejeitar o juízo prévio ao longo da pesquisa. Mas ele é necessário como norte. Para pesquisar alguma coisa, primeiro temos que saber o que nos inquieta. E para que algo tenha esse efeito sobre nós, provavelmente temos algumas hipóteses para responder a pergunta, que serão testadas ao longo do trabalho.

Essa história é um típico exemplo de erro na pergunta que acaba por conduzir a ausência de resposta. Não vou dizer qual o erro, é claro! Divirta-se!

Mas ela me faz pensar nas várias “perguntas filosóficas clássicas” que permanecem sem resposta. Será que elas não padecem do mesmo erro?

Por exemplo, aquela santíssima trindade: “o que somos, de onde viemos e para onde vamos?” (nas suas mais variadas proposições). Fora milhões de outros temas. Não preciso aqui perder tempo dando exemplos quando você mesmo (ou mesma, para entrar no clima dessa forçada igualdade de gênero na linguagem) sabe.

Uma imagem muito boa para isso é a da vibração de uma corda. O movimento (harmônico) que ela exibe se tocada não vem do toque, mas de propriedades inerentes à corda. Será que ficamos procurando pelo dedo que toca a corda, ao invés de descobrir quais são as propriedades dela?
Será que durante mais de 3 séculos buscamos em vão respostas para as perguntas que de fato não tem resposta? Mas só porque fizemos perguntas que contém em si a inexistência de resposta. E qual é a pergunta que nos permitirá chegar numa resposta? (já até abandonei o “pergunta certa” agora).

Para terminar numa perturbadora circularidade (ao menos para mim): será que questionar sobre as perguntas que nos fazemos é uma pergunta com resposta?